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Explosões e tiros de metralhadora ecoam pelo campo num acampamento da Guerra Civil.

  • Vários soldados juntam-se à volta de uma pequena mesa.
     
  • A jogar cartas e a trocar dinheiro de mãos num jogo de poker para passar o tempo.
     
  • A batalha pode estar quase a chegar.

Mas estes homens estão focados no jogo...

Esta cena não é de um filme. Era uma tarde provável para muitos soldados durante a Guerra Civil Americana entre 1861 e 1865.

Infelizmente, a guerra e o conflito armado têm sido uma parte significativa da história da humanidade. Desde guerras mundiais a guerras civis e à defesa de pretensos conquistadores, a vida de um soldado pode ser bastante violenta.

Neste artigo, vamos expor a história do poker no decorrer dos tempos conflituosos.
 

Índice

  1. Poker Como Escapatória da Guerra
  2. Revolução Americana
  3. Guerra Mexicano-Americana
  4. Guerra Civil Americana
  5. Guerras Mundiais
  6. O Poker no Exército


Poker Como Escapatória da Guerra

Por vezes, a guerra pode ser bastante aborrecida nas alturas em que as tropas esperam pela batalha seguinte. Para muitos soldados ao longo da história, um jogo de poker oferecia uma excelente forma de passar o tempo. Talvez o poker distraísse os jovens militares daquilo que estavam lá realmente a fazer: matar e derrotar o inimigo.

Imagine o stress que advém de garantir a sua própria sobrevivência na esperança de ver os seus entes queridos novamente, um dia.

Campos de guerra e quartéis podem parecer locais pouco prováveis para um jogo de poker. Mas para muitos soldados ao longo da história, jogar cartas durante a guerra tem sido a escapatória perfeita.

O poker providencia uma libertação da mundanidade, violência e nervos à flor da pele que viver numa zona de guerra traz. 

Revolução Americana

poker guerra revolução americana

Apesar do jogo que conhecemos como o poker não ter nascido até inícios do Século XIX (boa oportunidade para saber mais sobre a história do poker, já agora), os Americanos já jogavam jogos de sorte e azar na era colonial. Foi algo que nasceu da popularidade das apostas no continente Europeu.

Isso incluía jogos de cartas como piquet, whist, faro, entre outros. Estes contrastam com o que muitos consideravam serem sensibilidades puritanas.

“Aliás, o jogo, seja cartas, dados, gamão ou bilhar, tornou-se numa imagem de marca da cultura elitista Virginiana”, escreveu o autor David Scwartz em Roll the Bones: The History of Gambling.

O autor conta a história de um visitante Francês à Virgínia em 1686 que observou a propensão contínua do seu anfitrião para o jogo. O visitante notou que o seu anfitrião colocou um jogo de cartas em andamento imediatamente após o jantar, algo que ele achou estranho.

“À meia noite, quando a impaciência do viajante foi finalmente notada por um dos jogadores de cartas, ele foi aconselhado a retirar-se para a cama, pois o jogo estava a aquecer”, escreveu Schwartz. “Na manhã seguinte, o Francês acordou para ver os senhores ainda envolvidos no seu jogo de cartas.”

Na altura em que a guerra entre as colónias Americanas e os Britânicos começou, em 1775, é seguro apostar que pelo menos alguns jovens soldados eram fãs de jogos de cartas a dinheiro.

Até o General George Washington era conhecido como um jogador regular e mantinha anotados os seus ganhos e perdas na mesa de jogo.

general george washington pokerMas durante a guerra, Washington pediu às suas tropas para deixarem de jogar e focarem-se na liberdade da nação. Ele chegou a descrever o jogo de sorte e azar como “o filho da avareza, irmão da iniquidade e pai da maldade”.

Apesar do jogo entre as tropas ter provavelmente continuado, muitos soldados talvez não tivessem o dinheiro necessário para jogar. Washington tinha de suplicar regularmente ao Congresso para pagar aos seus soldados.

Em Novembro de 1781, os bloqueios britânicos ao comércio americano e a incapacidade de obter mais empréstimos vindos de França impossibilitavam o Congresso de pagar às tropas.

O Tratado de Paris foi assinado em 1783, colocando um fim à guerra e tornando os E.U.A. num país independente. Até Washington, que acabaria por se tornar no primeiro presidente da jovem nação, estava surpreendido com o resultado.

Tal como acertar dois outs no river, ele considerava a vitória de um país tão jovem sobre um poder tão dominante como algo “bem próximo de um milagre”.

Guerra Mexicano-Americana

Esta guerra, de 1846-48, foi a primeira batalha dos Estados Unidos em território estrangeiro (parcialmente) e resultou numa expansão significativa do território americano. O Texas tornou-se independente do México em 1836 e, em 1844, foi anexado aos Estados Unidos.

James Polk, o então presidente dos E.U.A., posicionou as tropas ao longo da fronteira entre o Texas e o México para proteger a anexação deste Estado. Pequenas escaramuças transformaram-se, eventualmente, em quase dois anos de luta.

bandeira

Para além dos milhares de feridos, mais de 1.700 soldados Americanos e 5.000 soldados Mexicanos morreram.

Mais ainda, cerca de 4.000 civis podem ter morrido na guerra que foi travada no Texas, New Mexico, Califórnia, México e Mexico City.

“Uma escaramuça que começou na fronteira ao longo do Rio Grande deu início à batalha e seguiram-se uma série de vitórias americanas”, diz o site History.net sobre a guerra. “Quando as coisas acalmaram, o México perdeu cerca de um terço do seu território, incluindo quase a totalidade daquilo que é hoje a Califórnia, Utah, Nevada, Arizona e New Mexico.”

A guerra Mexicano-Americana contribuiu para o crescimento da fama do poker entre soldados. Por esta altura, o jogo já tinha saído de New Orleans. Tornou-se popular entre Americanos que viajavam nos barcos no rio Mississippi. Os jovens levavam, então, esse interesse no jogo para os acampamentos das tropas nos Estados Unidos, no México e no Sudoeste.

É seguro apostar que muitos desses jovens soldados que iam para a guerra contra o México tinham jogado poker nesses barcos. Ou, pelo menos, tinham aprendido a jogar com jogadores que jogaram poker algures no Mississippi.

Esse interesse no jogo espalhou-se, aparentemente, ao longo da guerra e mesmo após a mesma. Os jogadores de poker ensinavam os outros a jogar entre batalhas.

“Apesar de muitos oficiais e capelães o desencorajarem, uma quantidade crescente de veteranos da Guerra Mexicana e jovens recrutas andavam com um baralho de cartas nas suas sacolas”, escreveu James McManus em Cowboys Full: The History of Poker.

Muitos desses novos territórios ganhos após a vitória americana na guerra seriam muito importantes no crescimento do poker nos anos seguintes. Com a expansão a Oeste e a corrida à mineração de prata e ouro, a popularidade do poker cresceu nos Estados a Oeste.

Era possível encontrar jogos a decorrer em campos de mineração, saloons, salar de bilhar, salas dos fundos e barracões.

E em qualquer sítio em que os jogadores estivessem dispostos a apostar alguns dólares, havia jogos de cartas.  

Guerra Civil Americana

A Guerra Civil Americana foi um evento violento e brutal, colocando familiares uns contra os outros. Os especialistas determinam que mais de 750.000 soldados perderam a vida tanto na União como na Confederação.

Muitos outros perderam membros do corpo ou acabaram com lesões que os debilitaram para sempre. É fácil imaginar o poker como uma forma de distrair os soldados daquilo que se passava à sua volta.

Não era incomum ver soldados à volta de uma mesa a jogar poker, tentando fazer mais algum dinheiro para compensar os seus míseros salários. Isto foi, inclusivamente, mostrado em fotos daquela era. Os soldados tinham muitas vezes de esperar horas e horas pela batalha seguinte e muitos usavam o poker para passar o tempo mais facilmente.

"Para centenas de milhares de soldados nos acampamentos da Guerra Civil, o jogo era um melhor entretenimento do que beber, andar à luta, jogar chuck-a-luck (um jogo de três dados similar a craps) ou apostar no resultado de uma corrida entre piolhos”, escreveu McManus em Cowboys Full: The History of Poker.

 

soldados a jogar poker


Com muitos soldados a enfrentar uma probabilidade significativa de morrerem, economizar aquilo que ganhavam podia não ser visto como uma grande prioridade. A foto acima mostra soldados de campo da 114ª Infantaria da Pensilvânia a disputar um jogo de poker.

A foto foi tirada em Agosto de 1864 em Petersburg, Virginia e mostra como era o poker num acampamento da Guerra Civil. Estes soldados da União estão a olhar para as suas cartas, rodeados de tendas de lona.

Os homens têm os seus cachimbos acesos e estão a acompanhar o jogo com uma bebida alcoólica que podemos ver na mesa. Com a possibilidade de terem de enfrentar bolas de canhão e tiros de espingarda muito em breve, um jogo de cartas era mais do que bem-vindo para relaxar e distraí-los da realidade que aí vinha.

Guerras Mundiais

Tal como em guerras anteriores, os soldados nas I e II Grandes Guerras procuravam formas de passar o tempo. Era fácil ficarem aborrecidos entre batalhas e o poker parecia ser, muitas vezes, uma solução. E isto aplicava-se aos soldados dos vários países envolvidos nas duas grandes guerras mundiais do Século XX.

Uma figura fundamental para o fim da Primeira Guerra Mundial era, também, um ávido jogador de poker. Herbert Yardley era um criptologista talentoso que passou anos na mesa de poker. Ele serviu nos Signal Corps (um comando do Exército dos Estados Unidos que gere as comunicações) durante a guerra e ajudou a liderar os esforços militares do país.

poker guerra mundial

Yardley e a sua equipa começaram a decifrar códigos alemães, contribuindo fortemente para o fim da guerra. No final do conflito, ele foi nomeado chefe do U.S. Cipher Bureau e começou a decifrar códigos japoneses. Mas o departamento acabou por ser extinto e Yardley começou a sua vida como autor.

O seu livro de memórias, The American Black Chamber, deu aos leitores uma visão interna daquilo que era o serviço de inteligência militar dos E.U.A. O conteúdo do livro não foi propriamente do agrado do governo federal.

Yardley é lembrado como um James Bond da vida real que até incluía o amor pelo jogo. No seu livro de 1957, The Education of a Poker Player, ele detalhou a sua própria vida nas mesas naquele que pode ser considerado um dos primeiros livros de estratégia de poker.

Este agente federal e jogador de poker não tinha qualquer problema em vangloriar-se sobre o seu sucesso nas mesas. As suas reflexões sobre o seu tempo a jogar poker remontam a essa comparação com James Bond. A inteligência militar, viajar pelo mundo e, aparentemente, nunca perder foram fatores determinantes para tal.

“Eu ganhei consistentemente no poker durante toda a vida – na minha terra natal, em Indianopolis, Washington, Nova Iorque, Hollywood, Londres, Paris, Cairo, Roma, Hong Kong, Chungking, em barcos, comboios e aviões”, escreve o autor na primeira linha do livro The Education of a Poker Player. “E nunca perdi em três sessões consecutivas.”

Durante a II Guerra Mundial, os soldados pela Europa fora e a Sul do Pacífico tentaram a sua sorte no poker, ocasionalmente.

A Playing Card Company dos E.U.A. até fez um acordo com o governo americano para enviar baralhos de cartas para os soldados. Eram jogados muitos jogos como o Espadas e o Copas, mas os soldados com mais tempo disponível também jogavam poker entre batalhas.

Aliás, o interesse dos soldados pelo poker até desempenhou um papel no resgate daqueles que estavam atrás das linhas inimigas.

“Foi a marca Bicycle que mais fez pelas tropas”, diz a Business Insider. “No decorrer da II Grande Guerra, a Bicycle uniu-se às agências de inteligência britânicas e americanas para criar um baralho de cartas que se desfazia quando molhado. As cartas, então, revelavam mapas secretos de fuga, para que pilotos abatidos e soldados capturados pudessem voltar às linhas dos Aliados.”

A Bicycle chegou mesmo a reproduzir esses baralhos, chamados de “Escape Map Deck”. A marca reproduziu fielmente o grafismo original tanto da frente como do verso das cartas.

O poker era, com certeza, um passatempo popular entre as tropas. Depois da guerra, estes soldados voltaram para casa e continuaram a jogar.

Devido a isso, o poker tornou-se bastante famoso nos anos 50. Era uma das principais escolhas para jogar com amigos e familiares. E muitos passaram o conhecimento do jogo aos seus filhos.

O Poker no Exército

Na altura da Guerra do Vietname e de outros conflitos que vieram a acontecer mais tarde, o poker já tinha crescido. Muitos soldados já estavam familiarizados com o poker. E um deles era o eterno comentador do World Poker Tour e membro do Poker Hall of Fame, Mike Sexton.

Sexton, um paraquedista no Exército Americano alistou-se no decorrer da Guerra no Vietname. O poker tornou-se, imediatamente, uma parte da sua vida no exército. Ele entrou num jogo de Seven Card Stud ($5 limit, $1 ante) no decorrer da sua pimeira semana de treino em 1970 em Fort Benning, Georgia.

Não havia fichas de poker, apenas dinheiro e os jogadores davam as cartas no chão de uma casa de banho em vez de uma mesa depois das luzes se apagarem. Mas o jogo foi cancelado apenas 90 minutos depois de ter começado e todos os jogadores, como castigo, foram enviados para trabalhar na cozinha. 

Ainda assim, Sexton saiu com um lucro de $43 desse jogo. Essa história era uma das suas memórias favoritas da escola de salto e do seu tempo como membro da 82nd Airborne Division.

“Cresces mesmo quando passas tempo no exército”, disse Sexton ao site WSOP.com em 2019. “É uma experiência que muda a tua vida. E ganhas respeito por aqueles que serviram e ficaram incapacitados ou fizeram o sacrifício final, porque estás bem ciente de que poderias ter sido tu.”

Sem dúvida, muitos outros soldados e infantaria têm histórias similares. Jessica Dawley, a vencedora do World Series of Poker Womens de 2018, fez parte da Força Aérea Americana entre 2001 e 2007. Ela relembra com carinho aqueles jogos no quartel enquanto estava no Médio Oriente e noutros locais.

Dawley jogou poker nas forças armadas por muitas das mesmas razões pelas quais os civis amam o jogo e gostam de jogar cartas.

“O poker era o nosso entretenimento principal quando eu estava no exército”, disse ela. “Fosse no estrangeiro ou nas bases em território americano, encontrávamos sempre uma forma de jogar. Era uma forma saudável de descontrair e divertir-nos.”

Amante e jogador de poker, Frederico traz temas de interesse sobre a modalidade para o nosso blog. Artigos sobre estratégia, dicas, notícias ou simples curiosidades marcarão presença assídua aqui, na 888Poker.